sábado, 16 de novembro de 2013

No Paraná, recursos da Apae bancam clubes sociais privados

Atualizado em 15/11/2013 
Por Luis Nassif


Em fins de agosto, o governador Beto Richa lançou o programa “Todos Iguais Pela Educação”, preparado pelo vice-governador e Secretário da Educação Flávio Arns

De acordo com o site da Secretaria de Educação, o “todos iguais” não se refere à igualdade de condições dos alunos. A intenção do programa é conceder “às escolas básicas de Educação Especial, mantidas pelas Apaes e outras instituições sociais, os mesmos direitos e recursos destinados às escolas públicas da rede estadual”. Serão R$ 420 milhões para permitir que as escolas Apae possam concorrer com a rede regular de ensino. 

Vamos escolher aleatoriamente uma delas, a da cidade de Califórnia, a primeira mencionada no comunicado da Secretaria da Educação (http://tinyurl.com/kaw69cb). 

“A escola especial de Califórnia atende 83 alunos, de bebês de três meses a idosos, 19 deles em período integral. Além das aulas de educação infantil, ensino fundamental e educação de jovens e adultos, são oferecidas fisioterapia, psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, assistência social e equinoterapia. Também são promovidas atividades de artesanato e de confecção”

Uma visita ao site da Apae de Califórnia revela algumas surpresas (http://glurl.co/cMu). 

Antes, é importante ressaltar que o caso California não pode ser generalizado sem, antes, se proceder a uma boa pesquisa. Mas é ilustrativo da absoluta falta de controle sobre o sistema Apae. 

Todas suas atividades têm isenção tributária. Mas o que se vê na Apae de Califórnia é um conjunto de atividades econômicas e sociais, a maior parte das quais não relacionada com a educação especial. A Apae mantém uma escola privada - onde não entram alunos com deficiência -, um clube esportivo, uma gráfica, um buffet, todos debaixo do manto da isenção tributária e todos compartilhando a mesma estrutura física. 

A cidade tem apenas 8 mil habitantes. A Apae foi presidida por Ana Mazeto, que se tornou a atual prefeita da cidade e correligionária de Beto Richa. 

A prefeita assumiu a Prefeitura denunciando seu endividamento. No primeiro ano, no entanto, adquiriu uma perua Freemont, da Fiat, por R$ 105 mil, para servir seu gabinete (http://tinyurl.com/kcxaky5). Revela a maneira como trata recursos públicos.


Embora do PSDB, o suporte para suas demandas junto ao MEC é do deputado petista André Vargas, do PT (http://tinyurl.com/mualxop). 

O guarda-chuva filantrópico da Apae 

Debaixo do guarda-chuva da Apae existe uma escola privada, a Escola Diego Henrique Gomes, com mensalidades de R$ 250,00 (http://glurl.co/cMv). E mantém a Escola Joana Carreira Portelinha – Educação Infantil e Ensino Fundamental na Modalidade de Educação Especial. 

O site da escola Diego informa que um de seus objetivos é “adotar uma política educacional inclusiva abrangente que permita à diversidade atendida experiências de transformação e emancipação”. 

A secretaria só abre após às 13 horas. Mas a simpática dona Neusa, funcionária que prepara o lanche das crianças, informa que não há crianças com deficiência na Escola Diego. Todas ficam confinadas na Escola Joana Carreira. Encontram-se apenas em festejos, como no Dia das Crianças. 

Todos os investimentos feitos pela Apae beneficiam a escola Diego: “Por ser mais um programa de Auto Sustentação, a Escola Diego Henrique é mantida pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Califórnia-Pr, sendo assim a escola é beneficiada com todos os espaços criados pela mantenedora”, informa o site da Apae. 

Graças a essa filantropia da Apae, a escola dispõe de uma estrutura extraordinária: piscina semi-olímpica de 312,50 m², duas piscinas infantis de 33 m², um salão de festas de 1.200 m², uma quadra poliesportiva coberta de 700 m², um campo de futebol suiço de 3.080 m², no total 11.580 m² de área construida. 

O clube social para “integração social” 

Para uma cidade de 8 mil habitantes, a Apae imbuiu-se de um alto espírito filantrópico, que lhe estimulou a lançar um clube social. 

A área social tem 5.100 m² com academia, sauna, piscina, churrasqueira, campos suíço, quadra coberta e parquinho infantil (http://tinyurl.com/mp3kyfe), tem “localização privilegiada, próxima ao centro comercial, e o melhor, pertinho de você” e dispõe de “um ambiente agradável e aconchegante, para descontração e socialização com uma pincelada de muita diversão”


As justificativas para os investimentos no clube são extraordinárias (http://tinyurl.com/mp3kyfe): 

"A Apae de Califórnia, ao longo de sua história, sempre teve presente a preocupação da integração social dos educandos dentre os mais diversos segmentos. Partindo deste principio, implantou programas de auto sustentação visando tanto a valorização do aluno especial, quanto as condições ideais de trabalho para toda equipe multiprofissional"


Não fica nisso. A Apae tem uma gráfica fornececendo serviços para terceiros. E um buffet com 1.000 m², que permite “um momento especial de renovação para sua alma e seu espírito” (http://tinyurl.com/ohqyw9n).

O atendimento às pessoas com deficiência 

O que justifica essa superestrutura, os repasses do MEC e da Secretaria da Educação e a isenção fiscal é uma escola especial que atende a 83 alunos, de bebês de três meses a idosos, 19 em período integral (segundo a Secretaria de Educação do Município, seriam 60 atendidos). 

Faturamento em gráfica, buffets, escola particular, clube social, mais os recursos financeiros do Ministério da Educação e da Secretaria da Educação do Paraná, tudo isso para atender a 83 alunos ou 60 alunos. 

Para dar conta da missão, a Apae conta com o seguinte quadro funcional: 

Bancados pela Secretaria de Educação do Paraná: 

16 Professores; 01 Secretária; 01 Professor Educação Física; 01 Professor Arte; 02 Atendentes; 01 Merendeira; 03 Auxiliar de Serviços Gerais; 01 Instrutor; 02 Professores PSS (temporários). 

Bancados pela prefeitura de Califórnia: 

01 Atendente; 01 Auxiliar de Serviços Gerais, 01 Telefonista; 01 Fisioterapeuta; 01 Professor Ed. Física. 

Bancado pelo SUS: 

01 Assistente social (40h); 01 Psicóloga (32h); 03 Fisioterapeutas (24h); 02 Fonoaudiólogas (20h); 01 Terapeuta Ocupacional (8h); 01 Neuro Pediatra (8h); 01 Auxiliar de Serviços Gerais.

Em Califórnia, a rede estadual atende apenas 3 alunos com deficiência. Havia duas escolas estaduais, uma fechou por falta de alunos. 

Segundo a Secretária de Educação do município, Maria Stela dos Santos, os recursos para educação inclusiva vão para a Apae que, segundo ela, mantém 60 pessoas de todas as idades. Ela não tem ideia do montante de recursos porque saem direto da Secretaria Estadual de Educação para a Apae. 

No site da Secretaria da Educação do Paraná, soa como escárnio a proposta do programa "Todos iguais pela Educação", de jogar R$ 420 milhões nas Apaes do estado, para que tenham condições de competir "em igualdade de condições", com a rede pública.

*Retirado do Jornal GNN

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