quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Condenação dos donos da Eternit: histórico acontecimento no direito à saúde ambiental e do trabalhador

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*Retirado do IHU Online

Quarta, 15 de fevereiro de 2012

Eternit, condenação histórica por tragédias humanas causadas pelo amianto

No Brasil, os produtos de amianto da Eternit foram disseminados por todo território nacional. Serviram até para cobrir habitações construídas pela Funai para índios.  Com amianto, a Eternit espalhou no Brasil de telhas para coberturas de casas, edifícios e puxadinhos, até jardineiras para flores. O comentário é do jurista Wálter Fanganiello Maierovitch em artigo no Terra Magazine, 14-02-2012.
Eis o artigo.

O magnata suíço Stephan Schmidheiny, 65 anos, e o barão belga Louis de Cartier de Marchienne, 92 anos, são os fundadores e proprietários da Eternit.

A Eternit infestou e contaminou vários países do planeta com produtos feitos com cimento amianto, que os donos da empresa-assassina sabiam ser prejudicial ao meio ambiente e à saúde das pessoas. Isto por provocar doenças mortais, como a mesotelioma. Todos os males causados pelo amianto provocam  dores insuportáveis nos enfermos e padecimentos cruéis.

Ontem, em sentença histórica lida em Torino (Itália) pelo juiz Giuseppe Casalbore, a dupla — magnata suíço e barão belga —  foi condenada à pena de 16 anos de reclusão por crimes causados pela omissão intencional (dolosa) de cautelas e desastre ambiental doloso.

Fonte: www.ceaf.mp.pr.gov.br

Além da condenação criminal, a Eternit terá de pagar 95 milhões de euros em indenizações pelos autores da ação civil. Os promoventes da ação indenizatória representam 1.830 mortos e 1.027 doentes terminais com asbestose e outros males causados pelo contato com o amianto.

Vale lembrar, como contado na edição de hoje do jornal italiano Corriere della Sera,  que a grande maioria das vítimas não trabalhava nas fábricas da empresa-assassina, mas morava em casas feitas com material da Eternit. Tem até casos de crianças que levavam as marmitas para os pais nas fábricas da Eternit e morreram pela contaminação por amianto.

No Brasil, os produtos de amianto da Eternit foram disseminados por todo território nacional. Serviram até para cobrir habitações construídas pela Funai para índios.  Com amianto, a Eternit espalhou no Brasil de telhas para coberturas de casas, edifícios e puxadinhos, até jardineiras para flores.

Para o ministro italiano da pasta da Saúde, Renato Balduzzi,  trata-se de “uma sentença que se pode definir, verdadeiramente, como histórica, seja pelo aspecto social, seja pelo técnico-jurídico”.

No nosso Supremo Tribunal Federal (STF) dormita recurso a respeito da constitucionalidade de leis e normas de proibição e das consequências do largo emprego do amianto comercializado pela Eternit no Brasil.

Apesar da sentença histórica e com a maioria dos casos ocorridos na cidade Casale Monferrato, na região italiana do Piemonte que tem como capital Torino, a Itália continua sob o nefasto efeito do amianto da Eternit.

Por ano, em toda a Itália, 3 mil pessoas adoecem em razão de contato com o amianto. Segundo dados levantados pelo Corriere della Sera, estão presentes na Itália de 30 a 40 milhões de toneladas de material com amianto da Eternit.

Atenção: o amianto não perde o potencial ofensivo com o passar dos anos. Será sempre causa de câncer e de outras doenças fatais de pessoas que, muitas vezes, não sabem estar próximas desse material.

Pano rápido

Seria de boa cautela verificar, nas habitações populares entregues pelos governos, o emprego de produtos da Eternit com amianto. E, lógico, o imediato exame de saúde e a remoção do produto das casas.
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Quarta, 15 de fevereiro de 2012

Eternit: ''Na repartição, éramos 30. Ficamos só em dois''

A raiva do trabalhador de macacão azul: "Nos enganaram durante anos. Tenho asbestose há 20 anos, me falta o ar e uso a bomba de oxigênio. Esse dinheiro não vai me ajudar a viver mais".

A reportagem é de Vera Schiavazzi, publicada no jornal La Repubblica, 14-02-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Mesmo que viva em Casale Monferrato há mais de meio século, Pietro Condello, 66 anos, continua falando com o sotaque da sua Messina. De 66 audiências, não perdeu nenhuma, sabe bem que aquele macacão, azul escuro com a palavra Eternit bordada em amarelo no peito, atrai as câmeras e os fotógrafos. Mas ele não se importa, e não é por isso que a usa, mas sim para lembrar os seus companheiros que não podem mais vesti-lo: dos 30 operários da repartição de "Matérias-primas", só dois estão vivos, e ele é um deles.

Enquanto o juiz Giuseppe Casalbore lia a interminável sentença com a qual o povo italiano fazia justiça aos mortos de Casale, Pietro Condello estava dignamente apoiado em uma balaustrada, muito perto do júri popular. E, às vezes, mas só às vezes, passava sobre os olhos e sobre o rosto um lenço branco dobrado em quatro, daqueles de tecido que ninguém mais usa.

Eis a entrevista.

Senhor Condello, está contente com essa sentença?


Contente? Não. É justa, a pena está certa, mas não há satisfação para nós. Não há dinheiro, e nem prisão, que possa pagar por aqueles que morreram. Se não os condenassem, então me sentiria humilhado. Não estou humilhado e não estou contente.

O senhor sofre de asbestose. Pode explicar o que isso significa?

Significa que eu tive mais sorte do que aqueles que morreram de mesotelioma. Significa que eu tenho uma invalidez crônica de 38%. Há 20 anos, me falta o ar, muitas vezes tenho que me conectar à bomba de oxigênio, todas noites eu durmo com três travesseiros atrás das costas, senão me sinto sufocado. Alguns dias por ano, vou para Varazze, na Ligúria, o médico diz que esse ar me faz bem, mas depois eu sempre volto para Casale. Lá estão os meus filhos, não posso ir embora.

Agora, com 35 mil euros de ressarcimento, o senhor poderá ir mais ao mar...

Não sei. Se os meus filhos estiverem de acordo, iremos mais. Mas 35 mil euros não são nada para quem está doente como eu. Eu só posso esperar morrer o mais tarde possível.

O que o senhor fazia na Eternit?


Eu entrei em 1966 e fiquei lá por 24 anos. Eu era carregador: descarregava do trem que parava lá perto os sacos cheios de amianto azul [a mortal crocidolita, importada do Leste Europeu, cujos efeitos cancerígenos já eram conhecidos nos anos 1960] e os carregava nas costas, 30 quilos. Cada um de nós tinha uma faca. Quando chegávamos perto da esteira, jogávamos os sacos em cima, os cortávamos e ela os levava aos operários e aos maquinários que trabalhavam o amianto.

O que lhe provoca mais raiva?

Quem me contratou, uma pessoa que eu conhecia. Ele já sabia que o amianto fazia com que as pessoas morressem, mas não me disse nada. Uma vez por ano, nos mandavam fazer exames de raio-X, a todos, mas não era algo bem feito, era uma piada. Se você tentasse protestar, lhe mandavam ao "Kremlin", a repartição de punição. Mas foi justamente quando eu entrei na fábrica que começou a luta. Pouco a pouco, começamos a entender que devíamos nos defender.

Por que o senhor vai ao tribunal com seu macacão? Não tem vontade de jogá-lo fora?


Não posso me esquecer dele. Fui com esta roupa até para Paris, a um encontro com outros operários que haviam trabalhado com o amianto. É inútil tirá-lo. É melhor vesti-lo por aqueles que não podem mais fazer isso. Algumas vezes, minha mulher a lavou e a passou.

O que o senhor se lembra dos seus colegas que já morreram?


Acompanhamos o último ao cemitério há oito dias. Eu estive muito nos hospitais, um pouco para as minhas visitas, um pouco para ir encontrar aqueles que morriam. Depois, deixei de ir vê-los, era terrível. Enquanto o juiz lia os seus nomes, eu os lembrei dentro de mim, todos aqueles que eu conseguia.

O que lhe parece mais injusto?

Primeiro, que tenham morrido tantas pessoas que jamais haviam trabalhado na fábrica. Não é que seja justo que os operários morram, não nos diziam a verdade. Mas quem morreu porque havia lavado um macacão ou respirado o ar sujo que existe em Casale, e ainda haverá por 40 anos, isso é ainda mais injusto. Em segundo lugar, o prefeito de Casale pensou em ganhar 18 milhões de euros em troca dos mortos. É uma velhacaria, ele não devia pensar nisso.
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Enquanto isso, o prefeito, George Demezzi, renunciou a esse dinheiro. Mas Pietro Condello acha que isso é o mínimo que ele podia ter feito e não lhe perdoa por sequer ter imaginado isso.
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Quarta, 15 de fevereiro de 2012

Eternit: ''Uma sentença que faz justiça'', afirma bispo italiano

Para o pastor da diocese italiana de Casale Monferrato, a condenação da Eternit um ato que paga apenas em parte a dor e os sofrimentos que a comunidade teve que sofrer durante décadas.

A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada no sítio Vatican Insider, 13-02-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

"É uma sentença que faz justiça e que era devida à cidade. A todos aqueles que perderam a vida, aos seus familiares, parentes. Aos muitos que sofreram e estão sofrendo". Essa é a afirmação do bispo de Casale Monferrato, Dom Alceste Catella, feita logo após a sentença do tribunal de Turim, que condenou a 16 anos de prisão o empresário suíço Stephan Schmidheiny, de 65 anos, e barão o belga Louis De Cartier, de 91 anos, da Eternit.

Fonte: static.hsw.com.br

O território de Casale Monferrato é o mais claramente afetados pelos desastres do amianto: os mortos e os contaminados são milhares, até porque a fábrica espalhava com poderosos ventiladores a poeira de amianto por toda a cidade, causando a contaminação até das pessoas que não estavam ligadas às atividades produtivas da Eternit.

A acusação havia pedido para ois réus, acusados de desastre ambiental permanente e omissão dolosa de precauções de segurança, uma condenação a 12 anos, aumentados para 20 anos por causa da continuação do crime. O processo instituído por Raffaele Guariniello havia iniciado no dia 6 de abril de 2009 e terminou hoje, atribuindo aos dois altos dirigentes da Eternit a responsabilidade pelas inúmeras mortes (cerca de 3 mil) por mesotelioma, uma grave forma de câncer, ocorrida entre os ex-empregados das fábricas da Eternit em contato com o amianto: a sentença emitida pelo tribunal de Turim é histórica, porque o caso Eternit é o primeiro no mundo em que a cúpula empresarial é condenada por desastre ambiental agravado, constituindo um importante precedente que poderia abrir caminho para dezenas de processos em toda a Europa.

"É um resultado obtido graças ao empenho dos juízes – continuou o prelado – aos quais cabe a tarefa de administrar a justiça, mas também a unidade de todos os casalenses, de toda a cidade cuja determinação tornou possível alcançar esse marco de justiça, porque tais situações não devem mais acontecer".

Mas, mesmo que tenha sido alcançada a meta fundamental e imprescindível desse percurso, para Dom Catella a obra de justiça não pode nem deve parar: "O mesmo empenho deve ser aplicado para seguir em frente nos estudos e nas pesquisas contra o mesotelioma, assim como nas obras de reabilitação às quais toda a cidade de Casale precisa. A atenção de todos deve permanecer alta – sublinha o prelado, em conclusão – por parte do governo que se interessou pela questão, pela administração regional, local, de cada um".
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