terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Vigilância Sanitária interdita laboratório que fazia exames para Prefeitura de Porto Alegre



Por Marco Weissheimer



Uma equipe da Vigilância em Serviços e Produtos de Interesse à Saúde, da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, interditou no último dia 04 de fevereiro o Laboratório de Análises Clínicas da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), por uma série de problemas que, na avaliação dos técnicos da Vigilância, caracterizariam “ausência de condições físicas e técnicas”. O Laboratório da Farmácia é um dos que atendem a rede municipal do SUS.


Relatório da equipe da Vigilância Sanitária diz que Laboratório 
de Análises Clínicas, da Faculdade de Farmácia, apresenta uma 
série de problemas que caracterizam “ausência de condições 
físicas e técnicas”. Foto: Filipe Castilhos/Sul21
Segundo o relato da Vigilância em Saúde, o laboratório realiza cerca de 50 mil exames por mês e atende de 60 a 100 coletas de pacientes por dia. O contrato firmado com a Prefeitura de Porto Alegre para atendimento é de 90 mil exames por mês para a rede de assistência SUS. O serviço atende, além da UFRGS, o PAM 3 (Vila Cruzeiro), o Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV), o Centro de Saúde da Bom Jesus, IAPI, Murialdo e, eventualmente, o Hospital de Pronto Socorro (HPS).

Ainda de acordo com o relatório da equipe da Vigilância, o laboratório realiza análises de hematologia, bioquímica, microbiologia, urinálise, imunoflorescência, parasitologia e de secreções. Algumas análises são terceirizadas para o Laboratório Endocrimeta, mas os técnicos registraram que não tiveram acesso ao contrato correspondente a essa terceirização. Alguns dos principais problemas apontados no relatório da vistoria foram os seguintes:

– O serviço possui área física subdimensionada para atender a demanda crescente de pacientes e exames. Além disso, as áreas do laboratório não atendem a norma para projeto arquitetônico de estabelecimentos de saúde, fato que comprometeria os fluxos e processos de trabalho e, consequentemente, a biossegurança.

– O laboratório da faculdade, por ser considerado um laboratório de extensão, possui cerca de 50% de seus colaboradores vindos da FAURGS (Fundação de Apoio à Universidade Federal do Rio Grande do Sul), como bolsistas de nível médio e superior. Apenas 2 funcionários de nível médio e 4 de nível superior são contratados da UFRGS. Devido ao grande número de bolsistas a rotatividade no serviço é alta, o que dificulta manter os processos de trabalho com continuidade e uniformidade.

– O laboratório possui Controle de Qualidade Externo, mas não avalia os resultados obtidos. Foram verificadas várias análises com resultados insatisfatórios emitidos em dezembro de 2014, que não apresentaram avaliação e medidas corretivas.

– Várias documentações não foram apresentadas como o programa de Risco Ambiental, registro de limpeza do reservatório de água, contratos com os serviços terceirizados.

– Não há controle de temperatura ambiente em nenhuma das salas do laboratório.

– Existência de apenas um lavatório para as coletadoras lavarem as mãos. Foi observado que as coletadoras não estavam realizando a lavagem das mãos e troca de luvas entre diferentes atendimentos, além de realizarem atendimentos sem luvas.

– No posto de coleta, foi observada a presença de alimentos em um refrigerador utilizado para armazenar amostras e não havia controle de temperatura do equipamento.

– No setor de microbiologia não são controlados os meios de cultura produzidos. Estes não teriam rastreabilidade e seriam preparados em salas compartilhadas com outras atividades de alto grau de contaminação.

– A sala de preparo de meios de cultura possui diversas atividades incompatíveis em termos de biossegurança. Nesta sala, por exemplo, são realizados o preparo das análises de fezes na mesma bancada onde o material limpo é embalado para ser esterilizado.

– Foram encontrados materiais como vassouras nos laboratórios que não podem ser utilizados nos estabelecimentos de saúde, o que indicaria a total ausência de critérios de higienização e treinamento dos funcionários.

Secretaria busca resolver o impasse

O Sul21 entrou em contato com um dos responsáveis técnicos do laboratório, mas ele disse que não estava autorizado a falar sobre a interdição. “Não posso me manifestar a respeito”, afirmou, observando que o assunto deveria ser tratado com a Reitoria ou a direção da Faculdade. O Sul21 também entrou em contato na última sexta-feira com a direção da Faculdade, a Reitoria da UFRGS e a Secretaria Municipal da Saúde para saber que providências foram tomadas e como ficam os serviços que estavam sendo executados pelo laboratório, mas não obteve resposta até a tarde desta segunda-feira (23/02).

Em correspondência encaminhada ao Conselho Municipal de Saúde, no dia 13 de fevereiro, o então secretário Carlos Henrique Casartelli informou que a Secretaria estava buscando “a melhor forma possível de resolver o impasse criado”. “Como o Laboratório de Saúde Pública da SMS expandiu sua área física, deverá assumir nas próximas semanas a realização de aproximadamente mais 70.000 exames/mês. Isto depende da aquisição de novos kits e recebimento de máquinas conforme pregão existente e realizado pela SMS”, disse Casartelli na ocasião.

A Coordenação da Vigilância em Saúde confirmou a interdição e disse que ela permanece vigente. Foi entregue à direção do laboratório um relatório com todas as inadequações encontradas na vistoria. Para levantar a interdição, o laboratório deve fazer as adequações solicitadas e solicitar uma nova vistoria, ou firmar um Termo de Ajustamento de Conduta para que essas providências sejam tomadas.

Críticas à terceirização

A terceirização da realização dos exames laboratoriais em Porto Alegre, tem sido objeto de críticas no Conselho Municipal de Saúde. “A Secretaria Municipal de Saúde a partir de 2004/2005 tem buscado apresentar uma nova proposta de gestão para a demanda da rede sobre a realização de exames laboratoriais realizados pelos laboratórios públicos e privados no município de Porto Alegre. No entanto, esta política não tem demonstrado eficiência e eficácia para o atendimento aos usuários assim como, do ponto de vista da gestão pública, não tem a transparência necessária, conforme preconiza a legislação vigente”, diz documento do Grupo de Trabalho do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre.

Em julho de 2014, os gastos com exames realizados em laboratórios privados, sem contrato, com a Prefeitura de Porto Alegre, foram denunciados pelo Sindicato dos Farmacêuticos e pelo Conselho Regional de Serviço Social do Rio Grande do Sul a órgãos fiscalizadores. As entidades também entregaram documentos sobre o tema à Câmara Municipal de Vereadores. O então secretário, Carlos Casartelli, repudiou as denúncias e decidiu acionar judicialmente os autores das acusações. O tema foi encaminhado para o Ministério Público Estadual, Polícia Federal e Ministério Público Federal.

*Retirado do Sul21
**Enviado pelo Fórum em Defesa do SUS do Rio Grande do Sul

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