sábado, 23 de março de 2013

A ideologia do medo toma conta da UFMA


Publicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 23/03/2013

Cartaz de chamada de um dos atos contra o autoritarismo
na UFMA que ocorreram em 2012

Ilse Gomes Silva 
Departamento de sociologia e antropologia e coordenadora do GEPOLIS

Joana A. Coutinho
Departamento de sociologia e antropologia e coordenadora do GEPOLIS


Alguns podem considerar estranho ou até exagerado comparar a sessão do CONSUN [Conselho Universitário] e a deliberação acerca da demissão do Prof. Gurgel como os tempos do autoritarismo da ditadura militar encerrada oficialmente desde 1985. Mas a intenção desse artigo é demonstrar que a comparação como os tempos de autoritarismo civil e militar não é absurda.

O autoritarismo na política brasileira tem sido endêmico desde o início da nossa formação social. Ao longo dos anos foi tomando diferentes facetas e se transvestindo de democracia restrita nos chamados períodos democráticos. O golpe civil militar que ocorreu em 1964 foi festejado por civis e militares como o último recurso para salvar a democracia dos supostos "elementos perigosos" que ameaçavam a paz e a ordem do país. Enquanto a tortura corria solta na ante-sala do governo, a grande mídia divulgava o milagre econômico e a vitória do futebol brasileiro. E para os descontentes a mensagem era: Brasil, ame-o ou deixe-o! Qualquer um que criticasse o sistema era considerado antipatriótico ou "perigoso" ao país.

Esse autoritarismo, conjugado com o chamado milagre econômico, foi festejado por muitos representantes das classes dominantes e das classes médias, que com medo da radicalização política das classes trabalhadoras e de qualquer proposta de transformação social optaram por abrir mão das frágeis instituições democráticas construídas no curto período de 1945 a 1963.


Os governos militares governaram o Brasil impondo a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento, que tinha como suporte a defesa da segurança interna contra "a ameaça do comunismo" e como principal instrumento a ideologia do medo e do terror. A repressão atingiu todos os setores da sociedade brasileira e teve como importante alvo as universidades, pelo "perigo" dos debates presente nessas instituições de “conquistar as mentes” do povo.

Infelizmente o autoritarismo, a política de governar pela imposição do medo, não ficaram no passado: ainda reina enquanto prática política dos governantes e dos dirigentes de instituições universitária, como tem ocorrido no Brasil afora e na Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

A atual gestão do Reitor Natalino Salgado tem se destacado pela prática corrente do autoritarismo, desrespeitando direitos básicos do processo democrático como o direito a liberdade de expressão e a garantia do debate político. A lista de atos autoritários é extensa. Destacamos apenas os exemplos mais recentes: 

- Durante a greve dos professores, em 2012, destituiu a diretoria do COLUN por ter aderido a greve, e em seu lugar impôs a presença de um interventor, acusado recentemente de prática de racismo. 

- Não permitiu a divulgação na página da UFMA de qualquer comunicado da Apruma

- Negou-se a discutir a pauta interna de reivindicação dos professores durante a greve. 

- Assinou o termo de adesão da UFMA à EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares) sem convocar o CONSUN para a respectiva deliberação e sem considerar as várias mobilizações e debates que manifestaram o repúdio a essa forma de privatização da saúde e dos Hospitais Universitários. 

- Convocou eleições às unidades acadêmicas somente após mandato judicial.

Mas a administração superior tem suas artimanhas e incongruências através da qual oculta e disfarça o seu autoritarismo com um discurso que reclama a democracia e tem como palco dessas incongruências as reuniões do CONSUN. Os termos do debate são manipulados e distorcidos e as deliberações são definidas no gabinete da Reitoria, cabendo ao CONSUN fazer a encenação de uma reunião democrática.

Durante a greve dos professores a Apruma pautou no CONSUN a discussão da suspensão do calendário acadêmico de modo a não prejudicar os estudantes, principalmente aqueles que estavam em vias de defender a monografia e colar grau. Mas ação da Reitoria foi de confundir a imprensa e manipular os alunos com a divulgação de que a Apruma estava propondo o cancelamento do semestre. A subserviência dos representantes aliados da Reitoria atingiu o auge da irracionalidade ao votarem contra a suspensão do calendário acadêmico, ao mesmo tempo em que aprovava o apoio a greve dos professores.

A reunião do CONSUN do dia 08 de fevereiro para deliberar sobre o recurso impetrado pelo professor Gurgel contra a sua demissão sumária mostrou mais um ato de autoritarismo do reitor Natalino Salgado, acompanhada da costumeira subserviência da maioria de seus membros. Apesar das excelentes intervenções da Apruma e do advogado de defesa sobre as irregularidades do processo e a desmedida da pena pelo suposto ato cometido pelo professor, a decisão já estava previamente tomada e a encenação não mudaria a decisão de demissão pelo fato de ter cometido a ousadia de criticar a administração superior. A sentença: aos amigos tudo, aos inimigos o rigor da lei, parece vigorar de vento em popa na UFMA; neste caso, nem se pode dizer em rigor da lei, já que esta, pelo que ficou demonstrado pela arguição da defesa, foi acomodada aos desejos da reitoria. 

Esta tem sido a prática de alguns reitores das universidades brasileiras e o espaço por excelência do debate, da diversidade, se torna numa unanimidade. E, parafraseando Nelson Rodrigues, a unanimidade não prima pela inteligência. 

É importante que todos fiquem atentos: esse ato não fere apenas o direito de um professor se expressar, atinge o principio fundante da democracia, mesmo que seja formal, que é o direito de expressão e institui a ideologia do medo, baseado na punição, ou na possibilidade de.

*Enviado por representantes da APRUMA
**Publicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 23/03/2013


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