quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Nota Política da Frente divulgada no Abrascão 2013: "A Saúde que Queremos!"


Há cinco dias atrás, publicamos no blog o Manifesto de Proposições que apresentamos e divulgamos no Congresso da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, mais conhecido como Abrascão, que aconteceu no início deste mês de outubro.

Agora, publicamos também a Nota Política que entregamos e divulgamos as/aos participantes do Abrascão 2013. Não perca!

Nota Política:
"A SAÚDE QUE DEFENDEMOS!"


A Frente Nacional contra a Privatização da Saúde não concorda com os rumos da política de Saúde brasileira que está na contramão dos princípios da Reforma Sanitária, do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Constituição Brasileira de 1988, pois tem favorecido os interesses dos grupos poderosos que usam a saúde como fonte de lucro. 

O Movimento Sanitário dos anos 1980 defendeu intensamente o uso dos recursos públicos para ampliação dos serviços públicos com a expansão do setor estatal em níveis federal, estadual e municipal, tendo como meta uma progressiva estatização da Saúde. Porém, agora quando o SUS faz 25 anos, fazemos o balanço de que os governos que se sucederam nesse período favoreceram a mercantilização da Saúde e a ampliação do setor privado na oferta de serviços de saúde no livre mercado e por dentro do SUS. 

O apoio do Estado à ampliação do livre mercado da Saúde tem se dado através da renúncia fiscal relacionada a planos e seguros privados de saúde, tornando o Brasil o segundo mercado mundial de seguros privados, perdendo apenas para os Estados Unidos; pela isenção de impostos aos grandes hospitais privados como o Sírio Libanês, Albert Einstein, entre outros; isenções fiscais para importação de equipamentos biomédicos e, recentemente, para produção interna, subsidiando a expansão desordenada de oferta para planos privados de saúde, enquanto a população usuária do SUS compõe uma grande fila de espera para procedimentos complexos, por insuficiência de oferta pública. 

Tal questão tende a ser aprofundada se for confirmada a edição de um “pacote” do governo federal de redução de impostos e subsídios públicos a planos privados de saúde, conforme amplamente anunciado pela mídia. Esta proposta pode ser a formalização final para a instituição de um seguro saúde e criação de um Sistema Nacional de Saúde integrado com o setor privado, tendo como consequência acabar com o SUS ou torná-lo um sistema focalizado, consagrando o processo de universalização excludente que vem ocorrendo desde os anos 1990, com a saída dos usuários de melhor renda, que foram impulsionados à compra de serviços no mercado privado devido ao sucateamento do SUS. Esse movimento faz parte do mesmo processo de aprofundamento da subordinação do país ao grande capital financeiro, atrelado aos interesses do imperialismo.

Recursos públicos do SUS têm sido alocados progressivamente no setor privado através de convênios e contratos: do total de internações realizadas no setor privado, na primeira década dos anos 2000, 74,5% foi custeada pelo SUS; do total dos recursos públicos do SUS destinados aos procedimentos hospitalares de média e alta complexidade, 57% foi destinado à rede privada/filantrópica contratada e apenas 43% à rede pública, no período de 2008 a 2012, caracterizando a privatização progressiva do fundo público, uma afronta ao artigo 199 da Constituição Federal, que assegura que o setor filantrópico ou privado é complementar ao público. Além disto, os recursos destinados à Saúde são insuficientes para atender as necessidades em saúde na atualidade, visto que a previsão do seu aumento, com a regulamentação da Emenda 29, frustrou as expectativas das/os brasileiras/os, não trazendo os esperados novos aportes de recursos para a Saúde, além dos contingenciamentos anuais que estes vêm sofrendo.

Propostas de flexibilização da gestão pública e de implementação de modelos organizacionais que seguem a lógica de mercado para gerir os serviços públicos constituem grave ataque ao caráter público da Saúde. Seguem uma racionalidade que fere mortalmente os princípios da administração pública direta, e têm sido concretizados nas três esferas governamentais através da proposição ou edição de Leis e Emendas Constitucionais que alteram o arcabouço jurídico e até os princípios que orientam a boa gestão da coisa pública, tendo como exemplos maiores as Emendas aprovadas no período do Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), o anteprojeto de nova lei orgânica da Administração Pública, e a criação dos denominados “novos modelos de gestão”, que têm em comum a personalidade jurídica de direito privado, quais sejam: as Organizações Sociais (OSs) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs) - entidades privadas ditas “sem fins lucrativos”, criadas pelo governo de FHC; as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs), proposta apresentada pelo governo Lula, revivida recentemente pelo Governo Dilma, e já implantada através de leis próprias em diversas Unidades da Federação (estados) e Municípios; e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), cuja lei foi aprovada em 2010 (governo Lula) e implementada em 2011 pelo governo Dilma, voltada para os Hospitais Universitários e demais hospitais sob responsabilidade federal, e que já começa a ser replicada em outras esferas, como é o caso do município do Rio de Janeiro com a “Rio Saúde”. 

Estas modalidades de gestão aprofundam a precarização do trabalho, desrespeitam o controle social e são formas mascaradas de privatização que ameaçam os direitos sociais, especialmente o direito à saúde, pois entregam a gestão das unidades de Saúde, patrimônio, equipamentos, serviços, trabalhadores e recursos públicos para entidades de direito privado. 

Essas três modalidades de mercantilização da Saúde constituem o mais grave e intenso ataque contra o SUS em toda a sua história, ameaçando o seu presente e inviabilizando o seu futuro.

A Frente considera que a resposta da presidente Dilma aos protestos populares, que se materializa em cinco “pactos” - um pelo equilíbrio e responsabilidade fiscal; um pela reforma política; um contra a corrupção; um pela Saúde e Educação; e um pela chamada mobilidade urbana - são insuficientes e não apresentam nenhuma mudança de fundo ou reforma estrutural para o atendimento das necessidades sociais que fizeram o país explodir.

As propostas com relação à Saúde não enfrentam a determinação social do processo saúde-doença, rebaixa a pauta da saúde à lógica incrementalista e assistencial, e reitera o modelo médico-centrado e a privatização. Os problemas do SUS não serão estruturalmente resolvidos, e em algumas dimensões até poderão ser aprofundados, com a implantação das proposições do chamado “pacto para a Saúde Pública”: 

1) A contratação de médicos estrangeiros não resolverá o problema de pessoal no interior e na periferia;
2) A abertura de vagas para a graduação em Medicina e para a Residência também não são soluções para a crise da Saúde se não forem  acompanhadas de discussão sobre o modelo de formação para o SUS, tendo ainda um agravante que contempla abertura de vagas para o setor privado. As vagas só deveriam ser para o setor público; 
3) A construção de novas unidades de Saúde Pública, sem especificar se serão 100% estatal, sob as normas do direito público, com contratação de pessoal pelo RJU e financiamento efetivo, também não trará melhorias para a Saúde; 
4) O fortalecimento da rede filantrópica é uma medida que aprofunda a privatização do sistema público de Saúde, já que se observa que a maioria dos hospitais filantrópicos são regidos pela lógica do  lucro, e o selo da filantropia os desonera de impostos que poderiam contribuir na constituição do fundo público. 

Posteriormente, é apresentado pelo governo o Programa Mais Médicos (MP número 621/2013) que procura consolidar algumas proposições já enunciadas, com a inclusão de outras. Neste, são apresentados três eixos principais. O primeiro é aumentar a duração do curso de Medicina para oito anos. Não tem sentido este aumento, o que deve ser realizado é uma ampla reforma do ensino médico com ênfase na formação geral e na realização de estágios no SUS, inclusive na Atenção Primária. O segundo é de promover abertura de escolas médicas e ampliar o número de vagas, incluindo o setor privado. Como já foi afirmado anteriormente, não se deveriam abrir vagas no setor privado, mas somente na rede de faculdades públicas, face a qualidade do ensino e a privatização da educação. O terceiro é promover o incentivo à interiorização do médico brasileiro e a vinda de médicos formados fora do país, através de vínculo de trabalho precário, com pagamento de bolsas e sem direitos trabalhistas. 

Ampliar o acesso de profissionais de Saúde e não apenas de médicos para o interior é uma necessidade, mas tem que ser enfrentada não com a precarização do trabalho no SUS e sim com a realização de concurso público (RJU) e com o estabelecimento da carreira única do SUS. 

Outro aspecto preocupante desta medida provisória é delegar à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) a concessão de bolsas para as ações de Saúde, o ressarcimento de despesas e promover as ações necessárias ao desenvolvimento do Programa Mais Médicos, ou seja, este programa será gerido por esta Empresa. A EBSERH está sendo contestada pelo Conselho Nacional de Saúde, pelas universidades públicas federais, pelos Hospitais e Institutos Federais, bem como pela Procuradoria Geral da República, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN n. 4.895/2013) no Supremo Tribunal Federal (STF). 

Caso o objetivo do governo seja dar respostas de fato aos problemas apresentados, deve-se por um lado, exigir o caráter público dos serviços que visam a atender direitos essenciais como Saúde, Educação e Transporte, que nunca podem ser resolvidos pela forma mercadoria. E para avançar, deve-se tocar na questão de fundo que é a produção social da riqueza e de sua acumulação privada. Nos tempos de hoje, uma questão é fundamental para reflexão: a vida e a reprodução podem ser garantidas pelo mercado e os monopólios capitalistas?

Face às questões apontadas, a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde defende as seguintes bandeiras fundamentais para a viabilização da Saúde Pública:

-> Defesa incondicional do SUS público, 100% estatal, universal, de qualidade e sob a gestão direta do Estado e contra todas as formas de privatização e Parcerias Público-Privadas

-> Alcançar um mínimo de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a Saúde, garantindo o investimento público e o financiamento exclusivo da rede pública estatal de serviços de Saúde, cumprindo o aprovado pela 14ª Conferência Nacional de Saúde, espaço de efetiva manifestação e de voz popular sobre suas reivindicações para a Saúde

-> Pelo fim da Desvinculação das Receitas da União (DRU)

-> Pela imediata auditoria da Dívida Pública. Dívida que consumirá 42,42% do Orçamento Geral da União de 2014 para o pagamento de juros e amortizações da mesma, em detrimento da área social. Repúdio e anulação desta dívida ilegítima e insustentável

-> Contra os subsídios públicos aos planos de saúde privados

-> Contra a entrada de capital estrangeiro nos serviços de assistência à saúde e pelo arquivamento do Projeto de Lei do Senado (PLS) 259/2009 que altera a artigo 23 da Lei 8080/90 para viabilizar o rentismo

-> Pela revogação da Lei 12.550/2011 que cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) e pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.895/2013 que tramita no STF. Não podemos entregar os Hospitais Universitários a uma Empresa de direito privado, quebrando a autonomia universitária no que diz respeito ao ensino e à pesquisa. Também não podemos permitir a criação de subsidiárias que entreguem os Hospitais Federais e Institutos à EBSERH, como a denominada empresa Saúde Brasil

-> Pela revogação da Lei 9.637/1998 que cria as Organizações Sociais (OSs) e pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.923/1998 que tramita no STF. As OSs desrespeitam o controle social, promovem a cessão de servidores públicos para entidades privadas, contratam trabalhadores sem concurso público, garantem a aquisição de bens e serviços sem processo licitatório, facilitando o desvio de recursos públicos

-> Pela anulação imediata da Proposta de Lei Complementar nº 92/2007, em tramitação no Congresso Nacional, que propõe as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs) para gerir todas as áreas sociais: Saúde, Assistência Social, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Previdência Complementar do servidor público, Comunicação Social e Promoção do Turismo Nacional

-> Defesa de concursos públicos pelo RJU e da carreira pública de Estado para pessoal do SUS e contra todas as formas de precarização do trabalho. Por reajustes salariais dignos e política de valorização do servidor, isonomia salarial, estabilidade no trabalho e implantação de Planos de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS)

-> Pela eliminação do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal para despesa com pessoal na Saúde

-> Contra o PL 4330, que permite a terceirização até mesmo da atividade-fim das empresas, rompendo todos os direitos dos trabalhadores brasileiros

-> Defesa da implementação da Reforma Psiquiátrica com ampliação e fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial, contra as internações e recolhimentos forçados e a privatização dos recursos destinados à Saúde Mental via ampliação de Comunidades Terapêuticas

-> Pelo cancelamento do Projeto de Lei do Deputado Federal Osmar Terra, que propõe alterações na Lei 11.343/2006 e inverte a prioridade de intervenção na área da Saúde Mental, que tem na internação compulsória o último recurso clínico para pessoas que apresentam problemas no uso das drogas, conforme a Lei 10.216/2001, colocando-a como primeira e principal estratégia de cuidado

-> Contra o modelo “médico assistencial privatista” centrado no atendimento individual e curativo subordinado aos interesses lucrativos da indústria de medicamentos e equipamentos biomédicos; e pela defesa da integralidade da assistência à saúde, através do fortalecimento da atenção básica com retaguarda na média e alta complexidade

-> Pela efetivação do Controle Social Democrático e das deliberações da 14ª Conferência Nacional de Saúde

Enfim, a determinação social do processo saúde e doença vinculada às relações sociais capitalistas, reprodutoras de desigualdades sociais e da barbárie, nos mobiliza a articular as lutas pela saúde com as demais lutas sociais pela superação desta sociedade. Desta forma, defendemos uma sociedade justa, plena de vida, sem discriminação de gênero, etnia, raça, orientação sexual, sem divisão de classes sociais! 

FRENTE NACIONAL CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA SAÚDE

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